Eça de Queirós (1845-1900)





Eça de Queirós

(25 de Novembro de 1845 - 16 de Agosto de 1900)




"Eça de Queirós tinha um estilo de escrita inteligente, lúcido e conciso, que conferiu à sua obra um carácter perene e actual, o que faz dele um dos escritores portugueses mais lidos e apreciados."




     "O sentimento que hoje domina os espíritos perante a política é sobretudo a desconfiança. Sente-se um vago receio. O governo está trémulo, a oposição inquieta, os homens dos pequenos partidos sem saber onde ir buscar o seu apoio e a sua força - o povo, descontente.
     Pressente-se que se vão passar os grandes factos, que resolvem as crises políticas com as crises da doença.
     Mas o quê? Hoje não há no país nenhuma ideia predominante, nenhum princípio querido, nenhum grande sistema surdamente combinado, nenhum vasto plano de organização social. Os homens políticos têm-se ocupado naquele embate de ambições, de intrigas, de transações, de regulamentos, de reformas imperceptíveis, em todo aquele movimento que ondeia lentamente de S. Bento às secretarias e das secretarias ao conselho de Estado. Fora desse movimento nada sabem, nada aceitam.
     Quando vier o momento do perigo, a que se há-de recorrer, a que ideia, a que sistema, a que método de governar? Vai-se procurar aos espíritos políticos e encontra-se lá um vazio: eles tinham-se só movido - não tinham pensado. As nossas finanças estão perdidas, a nossa instrução esquecida, o nosso exército desorganizado, o nosso funcionalismo corrupto, as nossas leis dispersas, o nosso comércio enfraquecido, a nossa autoridade moral perdida. De quem é a culpa? Não é destes nem daqueles, é da fatalidade das decadências. Se amanhã o país se encontrar na hora da agonia, e se se perguntar aos que pensam, aos que governam, aos que andam com o cérebro aceso alumiando a marcha - se se perguntar: que havemos de fazer?, é possível que eles respondam, e com justiça: sucumbir."

Eça de Queirós, in "Prosas esquecidas III: Política 1867"

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