Sou barbeiro

     Sou barbeiro. É uma coisa que pode acontecer a qualquer pessoa. Quero dizer que até esse dia fui um bom barbeiro. Cada qual tem as suas manias, eu não gosto de borbulhas.
     Aconteceu assim: comecei a barbeá-lo calmamente, afiei a navalha no braço da cadeira e suavizei-a na palma da mão. Sou um bom barbeiro! Nunca cortei ninguém e ainda por cima esse tipo não tinha uma barba muito espessa. Mas tinha borbulhas. Devo reconhecer que nas suas borbulhas não havia nada de especial, no entanto, incomodavam-me, enervavam-me, revolviam-me as tripas.
     A primeira, contornei-a bem, sem grande dificuldade, mas a segunda começou a sangrar. Então, não sei o que me deu, acho que é uma coisa muito natural, aprofundei a ferida e depois, sem poder deixar de o fazer, com um só golpe, cortei-lhe a cabeça.

Max Aub, in "Crimes exemplares"

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