Filhos

Acordar na cidade desconhecida, estrangeira provavelmente, não saber onde, com a mulher estrangeira, provavelmente desconhecida, ao lado, sonho que li algures antes de sonhá-lo. Mas não li que ao lado da cama se postaram os filhos meus desconhecidos, sorridentes, de calças curtas sobre pernas queimadas e firmes, e com uma fruta brasileira na mão. Esqueci-me talvez de que tenho filhos. Para os esquecer, preciso de tê-los. Para escrever também preciso de assunto; elimino-o escrevendo.
Os filhos abriram então os estores, lavaram-nos os pés, eu lavei-lhes os olhos, e depois devolvemo-los aos anjos. O dia vai começar.

Jorge Listopad, in "Primeiro testamento"

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