Onde o Capitão Cap faz brilhar aos olhos dos autores e dos editores uma sedutora aurora

   Se bem que muito exagerada por alguns choramingas, sempre estupefactos que as suas porcariazinhas não obtenham tiragens de cem mil e mais um exemplares, como diz o doutor Mardrus, a má venda do livro é um fenómeno triste mas incontestável.
   O Capitão Cap que eu nunca deixo de consultar em tais circunstâncias, deu-me a este respeito uma resposta que desvenda nele o economista distinto, tanto no profundo saber como no sólido bom senso:
   «Um livro só se vende bem com a condição de apresentar muitos clientes para fazerem a sua aquisição.
   Se o número destes clientes é medíocre, a venda do livro ressentir-se-á, e o comércio resultará tanto mais fraco quanto a quantidade de compradores for menos densa.»
   - Perfeitamente raciocinado, mas o remédio?
   - Muito simples, o remédio! Conceda-me alguma atenção.
   - Sou todo ouvidos.
   A solução que o Capitão oferece depressa entrará na prática, assim o esperamos, mas sem nos alegrarmos demasiado.
   Para igual sucesso, uma peça representada num teatro rende mais dinheiro que um romance publicado em livraria.
   Porquê?
   Porque se quereis ver várias vezes uma peça que vos agrade, tereis de cada vez de pagar novo bilhete, enquanto o exemplar de livro uma vez pago, o podeis reler com a frequência que vos agradar.
   Pior ainda: podeis emprestar o referido livro a milhares de pessoas, sem que este fervilhar de leitores ponha mais uma moeda na escarcela do pobre autor.
   Um espectáculo não o podeis emprestar ao vosso amigo mais íntimo.
   Contá-la? Sim, mas não é a mesma coisa.
   Compreendeis a diferença pecuniária destas duas formas de arte?
   Para o teatro (exceptuando os bilhetes de convite), são tantos os fregueses quantos os espectadores!
   Para o livro... Oh! preferimos não avaliar, seria muito triste!
   Tratava-se portanto de descobrir o meio que pudesse remediar, em relação ao livro, um estado de inferioridade tão aflitivo.
   Creio tê-lo encontrado.
   Aliás, a experiência, muito em breve falará mais alto que a mais astuciosa das teorias.
   Aprendam pois isto:
   Em breve irão aparecer alguns livros impressos em «tinta volátil».
   A tinta volátil é uma tinta que, exposta ao ar, se volatiliza - como o seu nome indica - sem deixar o menor traço perceptível.
   De tal sorte - e podeis ver a vantagem, para as livrarias e simultaneamente para os autores - que o mesmo volume, não poderá servir a mais do que um número restrito de leitores, logo que as suas páginas se tornaram brancas como o branco arminho, quer dizer, a breve prazo.
   Este engenhoso estratagema remediará a triste situação dos literatos, e é, mais uma vez, o que um futuro próximo se encarregará de nos ensinar.

Alphonse Allais, in "O Capitão Cap"


Comentários