Tio Lobo

Era uma vez uma menina muito gulosa que se chamava Carmela. Um dia antes do Carnaval, a professora disse na sala de aula:
- Quando acabarem os trabalhos, vou-vos oferecer uns bolinhos.
Mas a Carmela não queria trabalhar, e pediu licença para ir à casa de banho.
Como tinha sono, porque se tinha deitado muito tarde, adormeceu. E quando Carmela voltou à sala de aula, já lá não estavam nem a professora, nem os outros meninos; e dos bolinhos só restavam umas migalhas espalhadas pelo chão.
E Carmela, que era muito gulosa, foi para casa a chorar.
Assim que lá chegou, disse à mãe que tinha sido a única na escola que não tinha comido doces.
- Não fiques triste, Carmela – a mãe tranquilizou-a. – Vou-te fazer uns bolinhos de lamber os dedos.
Mas a mãe lembrou-se que não tinha onde fritá-los e disse- lhe:
- Vai a casa do Tio Lobo e pede-lhe para te emprestar uma frigideira.
A menina, que era muito gulosa, foi até casa do Tio Lobo e chamou-o cá de fora.
- Tio Lobo! – gritou a Carmela.
- Quem é? – respondeu-lhe uma voz lá de dentro.
- Sou eu, a Carmela. A minha mãe pediu para me emprestares uma frigideira para ela fazer uns bolinhos.
- Espera, que estou a vestir a camisa.
- Tio Lobo! – voltou a gritar. - A minha mãe pediu para me emprestares uma frigideira…
- Espera, estou a vestir as cuecas.
- Tio Lobo! – insistiu a Carmela.
- A minha mãe pediu para me emprestares…
- Espera, que estou a vestir as calças.
- Tio Lobo! – gritou mais alto. – a minha mãe pediu…
_ Espera, que estou a pôr o chapéu.
Por fim, o Tio Lobo abriu a porta e deu a frigideira à Carmela, mas avisou-a:
- Diz à tua mãe que, em troca, tens que me trazer uma dúzia de bolinhos, um pão de milho e uma garrafa de vinho.
E a menina voltou para casa toda contente.
A mãe fez os bolinhos e embrulhou uma dúzia para o Tio Lobo.
A seguir ao almoço, disse a Carmela:
- Vai levar ao Tio Lobo os bolinhos, o pão de milho e o vinho.
Mal saiu pela porta, Carmela, que era muito gulosa, não resistiu à tentação e comeu um bolinho enquanto pensava:
« O Tio Lobo só sabe contar até dez e não vai reparar que falta cá um.»
E tão bem lhe soube aquele bolinho que comeu outro e outro e mais outro… Até que não sobrou nem um.
Mas Carmela ainda tinha um buraquinho no estômago, de forma que também comeu o pão. Como tinha muita sede, bebeu o vinho todo.
Então, deu conta que tinha deixado o Tio Lobo sem merenda, e ficou cheia de medo.
E Carmela pôs-se a pensar…
Pensou, pensou, até que encontrou uma solução:
Carmela arranjou doze bolinhas de excremento de burro para substituir os bolinhos;
Depois encheu a garrafa com água suja e, finalmente, tirou um bocado de cimento de uma obra para fazer de pão.
Quando chegou a casa do Tio Lobo… as pernas tremiam-lhe como varas verdes.
- Tio Lobo! – gritou a Carmela.
- Quem é? – respondeu uma voz lá de dentro
- Sou eu, a Carmela. Trago-te a frigideira, uma dúzia de bolinhos, uma garrafa de vinho e um naco de pão de milho.
- Espera, que estou a vestir a camisa.
- Tio Lobo! – voltou a gritar. - Trago-te a frigideira, uma dúzia de bolinhos…
- Espera, que estou a vestir as cuecas.
- Tio Lobo! – insistiu a Carmela. – trago-te a frigideira…
- Espera, que estou a vestir as calças.
- Tio Lobo! – gritou mais alto. – Trago-te…
- Espera, que estou a pôr o chapéu.
Por fim, o Tio Lobo abriu a porta.
Carmela deu-lhe a encomenda que trazia, enquanto dizia:
- Aqui tens, Tio Lobo, tudo o que me pediste. E agora vou-me já embora porque tenho muita pressa e está a ficar de noite…
- Espera um pouco, Carmela. Quero provar os bolinhos para ver se estão bons – disse o Tio Lobo.
O Tio Lobo abriu o embrulho e provou o primeiro bolinho.
- Mas isto é excremento de burro! – gritou o Tio Lobo.
Rapidamente ordenou:
- Carmela, dá-me o vinho!
O Tio Lobo bebeu sem respirar e, de imediato, gritou…
- Este vinho sabe a urina de cão!
E logo, sem parar, pediu:
- Carmela, dá-me o pão!
O Tio Lobo mordeu-o com todas as suas forças, e teve tanto azar que… partiu os dentes todos! Então, cheio de raiva, o Tio Lobo gritou:
- Carmela, vai-te já daqui embora, mas lembra-te… esta noite vou-te comer!
Carmela voltou para casa, a tremer, e disse à mãe a choramingar:
- Mamã, esta noite o Tio Lobo vem cá a casa para me comer!
Então, a mãe fechou as janelas, trancou as portas e tapou os buracos para que o Tio Lobo não conseguisse entrar, mas… esqueceu-se de tapar a chaminé!
Quando anoiteceu, Carmela meteu-se na cama debaixo de sete cobertores e esperou. Pouco depois, do lado de fora da casa, ouviu-se uma voz:
- Carmela, sou eu, o Tio Lobo, e vou-te comer!
Ouviu-se um barulho no teto e uma voz que dizia:
- Carmela, já estou no telhado, e vou-te comer!
Ouviu-se um barulho na chaminé e uma voz que dizia:
- Carmela, já estou na cozinha, e vou-te comeeerrr!
Ouviram-se passos no corredor e uma voz dizia:
- Carmela, já estou a chegar, e vou comeeeerrrr!
Ouviram-se passos no quarto da Carmela e uma voz que dizia:
- Carmela, já aqui estou, e vou-te…
E, zás! Comeu-a! E assim come o Tio Lobo todas as meninas e meninos gulosos e mentirosos!

Xosé Ballesteros in "Tio Lobo"



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